à memória de Mário Alberto
Não sou saudosista, até porque sempre tive grandes dúvidas de que haja épocas dignas de serem vividas. Muito menos, acrescento, serei saudosista do que não vivi. E não conheci, infelizmente, o Mário Alberto. Gostava muito de me ter embebedado com ele, mas não calhou. Quando cheguei a Lisboa, já o Parque Mayer era uma ruína pouco aliciante, sem a corrosão ou a magia de outros tempos. Havia, é certo, algumas tabernas. Mas a própria Baixa foi definhando; as livrarias transformaram-se em bordéis, os cafés foram-se tornando irrespiráveis, incompatíveis, quase todos, com a minha obscena vontade de fumar. Resta o Estádio, na sua triste e azul teimosia. Nunca morri de amores pela Trindade, e a estátua pouco equestre do Pessoa matou-me de vez a Brasileira.
Não houve, repito, tempos melhores. Mas seria outra coisa, fatalmente preferível, encontrar num desses cafés o Manuel de Castro, o António José Forte, o Mário Cesariny, o Ernesto Sampaio - ou o Mário Alberto, claro. Hoje temos a pouca sorte de assistir à "criação ao vivo", como se a literatura fosse uma matança do porco, em directo. Temos, enfim, poetas muito mediáticos, gente deveras talentosa e os cagalhões ampliados da Joana Vasconcelos. Uma colorida tristeza, se virmos bem.
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Manuel de Freitas, Cólofon,
Lisboa: Fahrenheit 451, 2012
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